A Despedida.

Já era tarde da noite, eu estava sentado comendo alguma coisa sem gosto e acariciando algo imaginário em cima de mesa. Foi quando senti algo que sussurrava em meus ouvidos revelando aos meus sentimentos que ela não estava sozinha. Levantei lentamente a cabeça, olhei para frente e me deparei com seu sorriso. Sua imagem era tão real que fez com que eu levasse minha mão ao seu rosto para sentir a espessura de sua pele. Havia uma linha tênue, entre o real e o imaginário, que nos separava. E todas as vezes que eu tentava atravessar a maldita linha, a imagem real dela desaparecia. Veio então, em uma consciência espantadora, a verdade dolorida de que eu logo a deixaria. Pensei então, como seria, e se haveria, alguma despedida estúpida coberta de palavras desesperadas que clamam por um beijo inexistente, ou se deixaríamos, entre uma estrada e outra, um silêncio arrependido e cruel de quem prometeu não falar mais sobre amor.
Deixei de lado o que eu estava comendo, levantei da cadeira, apaguei a luz e fiquei parado na escuridão na esperança infeliz de que ela se tornasse real e não me deixasse fechar a porta. Ela havia me abandonado e eu agora me encontrava penosamente sozinho e cego. Em uma súbita coragem estranha eu movi minhas pernas na direção da luz e em uma gana desesperada minhas lágrimas começaram a lavar meu rosto misturando o que havia de doce e amargo em mim. Senti que seria para sempre assim: alucinação, escuro, solidão e lágrimas.
Cansado da dor, suportavelmente cruel, que atingia sem pesar a minha alma fria, procurei, entre sombras e fantasmas, o abraço da minha cama. Senti a maciez pesada do colchão e deitei como se nunca mais fosse levantar. Não fechei os olhos, deixei-os firme no teto como se ele fosse uma tela de cinema que projetava cenas da minha vida. E ali estava ela, sorrindo e iluminando as trevas da minha noite. Eu não conseguia mais fugir, eu não conseguia mais deixá-la, mas já era hora de eu me despedir. Fechei os olhos e não quis sonhar.


Cássia Fernandes.